Do direito à rescisão contratual e devolução de valores pagos quando há atraso na entrega do imóvel
Com o sonho de aquisição da casa própria, tornou-se cada vez mais comum a celebração entre consumidores e vendedoras/construtoras de contrato de promessa de compra e venda de unidades autônomas para aquisição de bens imóveis.
Os contratos devem ser regidos pela boa-fé objetiva, legalidade, equidade contratual. Entretanto, muitas vezes, na celebração de compromisso de compra e venda de bens imóveis, o contrato pactuado é um contrato de adesão, pelo qual não se dá oportunidade ao consumidor de analisar as cláusulas, visto que as mesmas são impostas unilateralmente pela vendedora.
A relação estabelecida entre as partes trata-se de nítida relação de consumo, tendo plena aplicabilidade o Código de Defesa do Consumidor, Lei nº 8.078/90, sendo plenamente possível a inversão do ônus da prova, devendo as cláusulas contratuais serem interpretadas da maneira mais favorável ao consumidor, conforme dispõe o artigo 47 do CDC.
A proteção ao consumidor também encontra amparo constitucional no art. 5º, XXXII, que estabelece: “o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor.”
Normalmente referidos contratos apresentam prazo de tolerância para finalização da obra e entrega do imóvel. O prazo estabelecido, por exemplo de 180 dias é totalmente crível, mas o que vem ocorrendo é um abuso no seu elastecimento, sob alegação da ocorrência de caso fortuito ou força maior.
Ocorre que, os fatores como a crise com a alta dos preços, escassez de mão-de-obra, bem como a crise hídrica são fatores inerentes ao risco da construtora, devendo ser por ela previstos quando da fixação do prazo para edificação e entrega da obra, não constituindo hipóteses de caso fortuito ou força maior, devendo sua responsabilidade ser considerada objetiva.
Este é o entendimento da Súmula 161 do TJ/SP:
Súmula 161 - Não constitui hipótese de caso fortuito ou de força maior, a ocorrência de chuvas em excesso, falta de mão de obra, aquecimento do mercado, embargo do empreendimento ou, ainda, entraves administrativos. Essas justificativas encerram “res inter alios acta” em relação ao compromissário adquirente.
Normalmente os contratos firmados com a vendedora/construtora contém várias cláusulas que somente a privilegiam, como é o caso das cláusulas de restituição de apenas 70% (setenta por cento) dos valores pagos pelo consumidor/comprador, em caso resolução a pedido da construtora.
Tal retenção tem sido considerada abusiva, principalmente quando o rompimento contratual ocorre por inadimplência da construtora, pois coloca o consumidor em total desvantagem, caracterizando enriquecimento ilícito, sendo passível de nulidade.
O artigo 51, inciso IV do Código de Defesa do Consumidor determina como nula de pleno direito a cláusula de contrato que: “coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade”.
Em relação a restituição dos valores pagos, a Súmula 543 do Superior Tribunal de Justiça, determina que deve haver a restituição integral das parcelas pagas pelo promitente comprador, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor:
“Na hipótese de resolução de contrato de promessa de compra e venda de imóvel submetido ao Código de Defesa do Consumidor, deve ocorrer a imediata restituição das parcelas pagas pelo promitente comprador - integralmente, em caso de culpa exclusiva do promitente vendedor/construtor, ou parcialmente, caso tenha sido o comprador quem deu causa ao desfazimento.”
Do mesmo modo, a Súmula 2 do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo prevê que a devolução dos valores pagos deve ocorrer de forma única:
“A devolução das quantias pagas em contrato de compromisso de compra e venda de imóvel deve ser feita de uma só vez, não se sujeitando à forma de parcelamento prevista para a aquisição.”
Ademais, descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra, também é cabível a condenação por lucros cessantes, conforme Súmula 162 do TJ/SP, cujo instituto visa compensar a privação do direito de uso ou fruição da propriedade.
Súmula 162: Descumprido o prazo para a entrega do imóvel objeto do compromisso de venda e compra, é cabível a condenação da vendedora por lucros cessantes, havendo presunção de prejuízo do adquirente, independentemente da finalidade do negócio.
Quanto aos índices de correção utilizados, tem sido decidido que o índice INCC (índice Nacional de Construção Civil), somente pode ser aplicado durante as obras, sendo que os adquirentes não podem ser responsabilizados indefinidamente pelos atrasos ocasionados pela empreendedora.
Assim, a correção monetária incide do acordo com o índice INCC até a data em que o imóvel deveria ter sido entregue, considerando também o prazo de tolerância estabelecido em contrato, devendo após este prazo, ser substituído pelo índice IGPM, aplicável a compromissos de compra e venda, devendo ser restituído aos compromissários-compradores, os valores cobrados em excesso.
Portanto, os consumidores devem ficar atentos quanto as propostas, cláusulas e condições estabelecidas no momento de firmarem contratos e adquirirem bens, a fim de resguardarem seus direitos.